Semana passada, quando cheguei ao curso pré-vestibular que venho freqüentando, o Rafael, estudante encarregado da monitoria durante o turno da noite, estava lento o mais recente livro de Eduardo Bueno (vulgo Peninha), “Brasil: Uma História”. Isso não chega a ser algo realmente surpreendente, visto que o sujeito pretende fazer o curso de história. Em outras palavras, por mais que os livros do desse autor tenham um teor mais leve e caráter menos didático, ainda assim narram fatos supostamente históricos e, a qualquer pessoa que trilhe por esses caminhos acadêmicos, deverá configurar-se como uma leitura, pelo menos, interessante. Mas é exatamente aí que, aparentemente, estou ronaldamente enganado...
Dias depois de notar essa leitura do meu digníssimo colega, o professor, que é um contumaz defensor das cátedras acadêmicas mais tradicionais, durante uma aula de história do Brasil, atirou, novamente, pedras pontiagudas contra o pobre-diabo do Eduardo Bueno. Meu professor realmente não vai com a lata do sujeito, mas não é por isso que esse costuma atacar tanto a obra daquele: o argumento é que o que o Peninha escreve é anti-história e que, muitas vezes, a verdade é distorcida e pode ter um sentido tendencioso, devido a falta de acuidade com os fatos. E, sinceramente, eu até que concordaria com esses argumentos, não fosse a própria verdade algo discutível e, os fatos históricos, apenas um dos milhares de pontos de vista possíveis (normalmente, aquele do vencedor) sobre um determinado evento - mais ou menos como a velha observação de como o holocausto seria visto, hoje em dia, caso Hitler tivesse ganho a guerra... Além do mais, outra acusação contra esses livros, seria a inclusão de alguns trechos menos relevantes para o contexto geral e com cunho meramente cômico, como por exemplo, a suposta disenteria de Dom Pedro I que o teria levado a gritar a independência ali mesmo às margens do arroio Ipiranga.
Em outra oportunidade – refiro-me a um texto no qual divaguei sobre as esquetes idealizadas por Eduardo Bueno e Pedro Bial, que foram ao ar dentro do programa “Fantástico”, aos domingos, em horário nobre -, eu já havia defendido essa ideia de popularizar, de algum modo menos enfadonho, o ensino ou pelo menos a acessibilidade do conteúdo de história. Afinal, esse não é exatamente um tema que se conversa a respeito com os amigos num boteco. Muito antes, fala-se dos bundões das “mulheres frutas”, ou do centro-avante incompetente de tal time, ou do Fernando Haddad, atual ministro da educação (bem, talvez estes dois últimos exemplos também sejam bundões, afinal de contas; mas que fique bem claro que, no primeiro exemplo, o bundão não tem caráter pejorativo de maneira alguma!) A verdade é que com o tipo de literatura e propostas de programação idealizadas pelo Peninha, o aprendizado de história acontece de maneira coloquial e prosaica, mesmo que não haja lá muito aprofundamento. Isto, daí, cabe aos que realmente se interessarem pelo tópico e que, apaixonando-se pelo conceito, quiserem correr atrás de mais informação. Mas note-se que, sem essa disponibilidade e abordagem mais leves existentes nesses “best-sellers pseudo-históricos”, aquela faisquinha de curiosidade pela área, despertada na leitura descompromissada de tais exemplares, talvez jamais tivesse acontecido.
Um outro fator que é importante salientar é que o Eduardo Bueno não é historiador, ou professor de história, ou sequer um “estudante universitário” do tema. Ele é um jornalista e, com a veia investigativa peculiar a esta classe, faz suas pesquisas visando criar conteúdos e livros, não históricos, mas de entretenimento. O próprio autor sempre deixa isso bem claro em entrevistas, reportagens e afins. O que Peninha faz é pegar o cabedal de algum evento histórico conhecido, genericamente, por todos, e transformá-lo numa narrativa mais romanesca, mais digerível. Isso não pode ser considerado um crime. E, se o for, poderia ser cometido mesmo por um professor de história. Mas, neste caso, seria justo configurar uma punição exemplar! Por crime doloso, quem sabe?