Ano zero, em uma maternindade qualquer, mais um bebê nasce, com sua indefectível cara de joelho, braços e pernas inquietos e errantes, pulmões a toda - choro. Um ou outro parente invariavelmente diz que é a cara do pai, ou tem os trejeitos da mãe. Algum mais engraçadinho menciona certa semelhança com o leiteiro...
Desde a tenra idade até os três anos completos, a criança é aquele prodígio e constante motivo de orgulho e satisfação dos pais: todo o rastejar é louvável, os primeiro passos são errantes, mas precoces! E quando surge o balbuciar das primeiras sílabas, todos o vêem como um futuro radialista, locutor, político, um ditador dialético e apaixonado - bem, talvez não. Fato é que o desenvolvimento da criança foi normal: nem aquém, nem além; normal. Uma criaturinha alegre e cheia de vida, mas já se excluiu a hipotética genialidade.
Mais três anos e as aventuras acadêmicas começam. A pré-escola propõe o desenvolvimento do comportamento social do indivíduo ao mesmo tempo que destaca suas idiossincrasias primordiais: afinal, agora é possível que Joãozinho tenha seus colegas como parâmetros e perceba que comer cocô não é legal...
Dos seis aos nove anos, a criança será alfabetizada, aprenderá a contar, fará amizades - e talvez sejam aquelas realmente verdadeiras, as de uma vida inteira. Talvez, comece a perceber, outrossim, alguma incógnita correlação com o sexo oposto. Ainda inexplicável. Ainda incoerente.
Começa o turbilhão da puberdade e da adolescência: para os meninos, os banhos tornam-se mais longos, a voz falha, o corpo espicha. As meninas largam as brincadeiras de bonecas, às vezes têm vergonha do corpo e tornam-se, quem sabe, introspectivas. E, claro, há a primeira menstruação!
Temos depois os quinze anos: as meninas debutando e já com graciosas formas; os meninos já mais graúdos e com pêlos aparecendo em profusão exponencial em lugares incômodos e inconvenientes. A ansiedade da fase é perturbadora porque se vislumbra todo um horizonte e as relações interpessoais são exploradas ao máximo. Aprende-se, vive-se. Muito, muito!
Aos dezoito anos, muitos estão terminando o ensino médio. É aquela aflição de definir o que se quer fazer, que função exercer neste raio de sociedade? Talvez, aquele sujeito pense em tirar a carteira de motorista... Não, depois, melhor depois: primeiro concluo os estudos, daí de repente penso nisso. Por ora, melhor continuar indo de "busão"!
E numa noite qualquer, com a breve experiência, mas ao mesmo tempo carregando uma bagagem unicamente sua e condizente com seus vinte e um anos, morre ao encostar-se na parada de ônibus.