Eu tive uma impressão - ruim, talvez - neste último finados: a de que ter um ente querido, amigo, parente ou mesmo conhecido, numa cova, é "cult". Claro, essa observação beira o extremismo e é um tanto generalizada, mas acho que qualquer um compreende a referência.
Já acho um tanto desnecessária a data em memória dos mortos - afinal, imagino que qualquer ser gostaria que se lhe lembrassem de seus feitos durante sua vida e não de seu cadáver putrefeito somente! A memória de uma pessoa deveria permear a vida das outras em todos os momentos - uma marca indelével no dia-a-dia de seus próximos; aquela coisa da influência: como você lembra de textos e citações de seu autor favorito, trechos de filmes e músicas que lhe são agradáveis, e outros pormenores que trazem riqueza ao seu cotidiano...
Fato é que fazer cara de consternado no finados é "chic". Não é permitido um sorriso amplo no cemitério - mesmo que o defunto em questão seja um tremendo fanfarrão. Pior do que sorrir num cemitério é não ter que ir ao cemitério! É gafe! Se ninguém muito querido a ti chegou ao final - fato
muito comum a todos os seres pluri-celulares - da vida, você não possui uma carga emocional convincentemente forte, que o eleve ao nível de "pessoa sensível". Se alguém próximo a ti morreu de fato, e tu não fostes ao cemitério, és um insensível incorrigível (ou talvez tu não gostes deste ambiente funesto, não é mesmo?).
A morte de alguém trás uma carga de tristeza intrinseca, mas isso não quer dizer que essa pessoa
precise ser lembrada de maneira triste e, pior ainda, somente no dois de novembro. Também o fato de uma vida ligada a ti ter se esvaído, não aumenta a tua presença de espírito ou torce o prisma que tu tens sobre a vida. Talvez uma perda te faça pensar sobre alguns aspectos que outrora eram deixados prá depois (a morte de alguém nos faz pensar que nós também somos mortais), mas se tu não souberes racionalizar a experiência, será apenas esse jogo de faz de conta.
Se realmente existe uma vida após a morte, os espíritos devem olhar aqui para baixo (ou para cima) e pensar:
- Quanta futilidade e hipocrisia! Quando em carne, eu não me lembro de ser tão amado...